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terça-feira, 21 de setembro de 2010

Um drama chamado Alzheimer

Mulheres lideram estatísticas da doença e também são as que mais se envolvem com o cuidado de quem a tem

Thaís Manarini, especial para o iG São Paulo 10/08/2010 14:19


Atualmente, cerca de 35 milhões de pessoas apresentam Alzheimer, uma doença degenerativa do cérebro que costuma aparecer a partir dos 60 anos e compromete as funções mentais e físicas de quem a tem. Por causa do crescente envelhecimento da população, estima-se que esse número dobrará em 20 anos.

O dado é preocupante, visto que a doença ainda não tem cura e seus sintomas cada vez mais severos – que incluem perda de memória, agressividade e dificuldades de fala e locomoção – afetam não só o paciente, mas todos os que o acompanham. Para tornar a jornada menos dolorosa, o primeiro passo é entender a doença e conhecer seus desdobramentos.
Por que ele aparece

Essa questão já está parcialmente resolvida. Sabe-se que durante o processo de envelhecimento normal substâncias conhecidas como proteínas tau e beta-amilóide vão se depositando nos neurônios. De acordo com o neurologista Ricardo Teixeira, diretor do Instituto do Cérebro de Brasília (ICB), “na doença de Alzheimer a velocidade desse processo é muito maior. E isso começa a interferir no funcionamento do cérebro, não só por atrapalhar a função dos neurônios, levando-os à morte, mas também por afetar a saúde dos vasos sanguíneos cerebrais”.

Embora a destruição dos neurônios seja um processo bem claro para os médicos, ainda não se sabe por que as substâncias se depositam de forma descontrolada e, mais importante, como evitar que isso ocorra.

“Não há nenhum medicamento que consiga impedir a morte dos neurônios. Por enquanto, as drogas usadas têm como proposta diminuir a velocidade do depósito, tornando a progressão da doença mais lenta”, conta a psicológica e gerontóloga Rosilene Alves de Souza Lima, da Clínica Espaço Saúde Integral e da Associação Brasileira de Alzheimer, regional São Paulo (Abraz-SP).

Outra questão que não está solucionada é por que a prevalência de Alzheimer é maior entre o sexo feminino. Um dos motivos levantados é o fato de as mulheres viverem mais tempo do que os homens e,
com isso, tornarem-se mais sujeitas ao desenvolvimento da doença. “Mas isso não explica por que a incidência é maior entre elas”, diz Teixeira. Segundo o neurologista, há evidências biológicas de que as mesmas alterações no cérebro causam mais sintomas nas mulheres do que nos homens. No entanto, “esse ainda é um tema em aberto, sem respostas definitivas”.

Caminho para o diagnóstico

De acordo com André Jaime, especialista em clínica médica e geriatria do Hospital São Luiz, de São Paulo (SP), e presidente do Departamento de Clínica Médica da Associação Paulista de Medicina (APM), geralmente a primeira região do cérebro afetada pelo Alzheimer é o hipocampo, responsável pela memória. Por conta disso, é natural que episódios de esquecimento sejam imediatamente associados à doença.

“Na maioria das vezes, porém, as queixas de memória de um idoso têm mais relação com quadros de ansiedade, depressão, transtornos do sono e estresse diário do que com doenças cerebrais”, salienta Teixeira. Sendo assim, antes de falar em Alzheimer é necessário realizar uma investigação bem minuciosa. E ela deve diferenciar três possíveis situações: alteração de memória normal, decorrente do envelhecimento; declínio degenerativo leve das funções cerebrais ou a presença de algum tipo de demência, como o Alzheimer. Só depois dessa distinção é possível definir como será o acompanhamento do paciente.

O médico do São Luiz informa que se as falhas de memória forem próprias de idade avançada, são indicados exercícios e atividades para estimular essa função cerebral. No segundo caso, ou seja, quando é verificado declínio cognitivo leve, a atenção deve ser especial, pois se trata de um indivíduo com mais chances de desenvolver alguma forma de demência. “Sugerimos reavaliações periódicas e mencionamos o risco para a família”, informa. Mas se o diagnóstico já apontar para o Alzheimer, é preciso dar início a um tratamento medicamentoso, cujo objetivo é tornar a evolução da doença mais lenta e a qualidade de vida do paciente melhor.

Sofrimento em etapas

O Alzheimer evolui progressivamente, afetando outras áreas do cérebro além do hipocampo. Na prática, isso significa que, à medida que a doença avança, o paciente não só tem falhas na memória como passa a apresentar períodos de inquietação, agressividade e desinibição e sente dificuldade para executar tarefas simples, como se vestir, tomar banho e comer. Em um estágio mais avançado, torna-se totalmente dependente e, muitas vezes, não consegue se locomover sozinho ou falar.

A velocidade do desenvolvimento do quadro é variável. Enquanto alguns demoram aproximadamente dois anos para passar da fase leve à grave, outros podem fazer essa transição em 10 anos. “Ainda não é possível saber se um paciente terá uma evolução mais rápida ou lenta”, comenta André Jaime.

Para quem acompanha um portador de Alzheimer, vivenciar todo esse processo é dramático. Até porque é impossível saber qual o dia exato em que a doença passará da fase leve para a moderada – há casos em que os familiares só se dão conta disso quando acontece algo grave, como o paciente se perder na rua e não conseguir voltar para casa.

“Logo depois do diagnóstico é necessário garantir que receba cuidados 24 horas por dia, mesmo que a contragosto”, frisa a psicóloga Rosilene.

A profissional ainda lembra que não são apenas os portadores da doença que devem ser assistidos. Para os parentes, ela explica, “o Alzheimer é uma espécie de luto em vida, pois o paciente está ali, de corpo presente, mas não é mais a mesma pessoa de antes. Isso sem contar que muitas vezes os papéis se invertem, fazendo com que os filhos precisem cuidar de seus pais. Essa situação é extremamente delicada”.

De ex-marido a filho

Maria Aparecida Fernandes dos Santos, 51 anos, dona de um salão de beleza na capital paulista, percebeu que havia algo errado com o ex-marido quando precisou impedi-lo de atirar e atear fogo no próprio carro, há cinco anos. “Ele dizia que havia gente lá dentro”, lembra. Por causa das alucinações e do emagrecimento exagerado do ex-policial Oswaldo Fernandes dos Santos, 80 anos, Cida decidiu procurar ajuda médica. Depois de muitos exames e várias doenças descartadas, veio o diagnóstico de Alzheimer.
“Achei que o resultado estava errado. Como ele foi alcoólatra a vida inteira, pensei que havia ficado maluco mesmo”, conta.
Não demorou muito para que suas dúvidas desaparecessem. De uma hora para outra Oswaldo começou a se perder na rua, deixou de reconhecer os dois filhos, ficou agressivo e passou a se recusar a fazer coisas simples, como comer e tomar banho. Como precisava de cuidados o tempo inteiro, voltou para a casa da ex-esposa.
Para entender o Alzheimer e aprender a lidar com Oswaldo, a empresária resolveu freqüentar reuniões da Associação Brasileira de Alzheimer (Abraz). No início, não se identificava com muitas histórias contadas ali, até porque o ex-marido passava pela fase leve da doença. “Mas, com o tempo, tudo aquilo começou a acontecer comigo. Aí me lembrava das orientações que havia escutado e as colocava em prática”, diz.
Uma das lições mais preciosas que Cida aprendeu foi não confrontar o paciente. “Às vezes estava trabalhando e ele insistia que queria sair. Em vez de bater de frente, entendi que bastava colocá-lo no carro e dar uma volta no quarteirão. Na hora das refeições também passava por alguns apuros, pois ele adquiria certas manias de tempos em tempos. Houve uma época, por exemplo, em que só aceitava comer manga. Depois, cismou com omelete”, lembra.
Ainda que esbanjasse jogo de cintura e criatividade ao encarar situações como essas, Cida sofria cada vez mais com as conseqüências do Alzheimer. Como Oswaldo se tornou extremamente dependente, ela acabou deixando o salão de beleza por conta dos funcionários. Em um mês, perdeu cinco quilos e ainda desenvolveu um problema no estômago. “Cheguei ao ponto de quase ficar doente também”, comenta.
Por não ter mais condições de suprir todas as necessidades do ex-marido, nesse ano a empresária decidiu colocá-lo em uma casa de repouso perto de sua própria residência. “Achei que não teria coragem, mas quando soube que duas amigas estavam trabalhando lá fiquei mais tranqüila”. De qualquer forma, no dia da internação, ela conta que passou o tempo todo chorando: “Foi extremamente difícil, mas sei que era o melhor que podia fazer por ele”.
Pelo visto, Oswaldo se adaptou muito bem ao novo lar. Além de ter notado que ele engordou, Cida brinca que o ex-policial já está até convidando as moradoras do local para dançar. Ainda assim, ele não parece ter dúvidas sobre quem é a mulher de sua vida.
“Ele não reconhece mais ninguém, só a mim. Às vezes chego a pensar que, se me esquecesse, doeria menos”, suspira.
abs,
Carla

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