01 semana atrás
A Sociedade Americana de Cardiologia Preventiva publicou a atualização de sua lista de “Dez coisas a saber sobre prevenção de doenças cardiovasculares” e um dos principais fatores de risco citados foi a manutenção de uma dieta inadequada. A orientação nutricional individualizada, estimulando pequenas mudanças na rotina alimentar do paciente, é capaz de melhorar substancialmente a saúde e a mortalidade por doenças cardiovasculares (DCV).
Quando se pensa em fazer uma rápida avaliação nutricional, o profissional deve analisar como está a qualidade da dieta, o total calórico ingerido e em quais horários são realizadas as refeições. Para fazer a orientação, é preciso se basear em padrões alimentares com evidência científica e individualizar o plano, levando em conta condições socioculturais, custo e disponibilidade de alimentos, e a priorização de metas de acordo com o estado nutricional e a presença de alterações metabólicas no paciente.
É interessante lembrar que a DCV aterosclerótica é rara entre as populações de caçadores-coletores, independentemente de seu consumo alimentar ser composto por dietas carnívoras ou vegetarianas, e tendo em vista que seu gasto energético total diário não difere de populações ocidentais. Isto pode ser explicado pela composição corporal desses indivíduos, que possuem IMC e percentual de gordura corporal baixos. Além disso, sua dieta é rica em alimentos integrais, fontes de fibras, e que são consumidos preferencialmente durante o dia, respeitando, desta forma, os ciclos circadianos naturais.
Pontos principais de atenção à Nutrição e Prevenção de DCV:
- Os tratamentos nutricionais mais eficazes em reduzir DCV são: baseados em evidências, promovem consumo de uma alimentação de boa qualidade nutricional, quantidade (total calórico) suficiente, e conduzem o paciente à manutenção desta dieta no longo prazo.
- Gorduras: as gorduras saturadas e trans são aterogênicas, pois provocam aumento de LDL-C e Apolipoproteína B, são pró-inflamatórias e causam disfunção endotelial. As gorduras saturadas devem ser substituídas por gorduras poli e monoinsaturadas, para reduzir risco CV. Apesar de banidas pelo USDA em 2019 (no Brasil, existe uma resolução da ANVISA para bani-las na indústria alimentícia até 2023), as gorduras trans ainda podem ser encontradas em: bolos industrializados, pães doces, chocolates, bolachas doces e salgadas, cookies, margarinas, pipocas de micro-ondas, pizzas congeladas, biscoitos de polvilho e sorvetes. Estas gorduras estão ainda mais fortemente associadas ao risco de DCV.
- Carboidratos: os carboidratos ultraprocessados (farinhas refinadas em geral) devem ser substituídos por carboidratos complexos ricos em fibras, como: alimentos feitos com farinhas e cereais integrais, frutas, verduras e legumes. Isso porque, carboidratos ultraprocessados promovem ganho de peso, aumentam o risco de hiperglicemia pós-prandial, hiperinsulinemia, hipertrigliceridemia, inflamação, disfunção endotelial, hiperatividade simpática e hipercoagulação – todos estes são fatores de risco de DCV.
- Padrões alimentares baseados em evidência: a Dieta Mediterrânea e a dieta DASH (Dietary Approaches to Stop Hypertension) são as dietas que possuem melhor evidência para prevenção de DCV. Ambas priorizam o consumo de: frutas, verduras, legumes, cereais integrais, laticínios magros, peixe, frango, carnes magras, oleaginosas, sementes, leguminosas e fibras.
- Outras dietas baseadas em evidência: dieta vegetariana e dieta Ornish. Um plano alimentar vegetariano inclui alimentos plant-based, como: vegetais, frutas, cereais integrais, leguminosas, sementes e oleaginosas. Em alguns casos, ovo, leite e seus derivados também são consumidos, porém nunca as carnes de animais. Aumentar o consumo de proteína vegetal pode estar associado a pequenas reduções no risco e na mortalidade por DCV. Entretanto, existem padrões de dieta vegetariana que não são saudáveis (excesso de sucos, bebidas açucaradas, cereais refinados, batatas fritas e outras frituras, doces) e estes podem aumentar o risco de DCV. A Diet Ornish é bastante restrita em gorduras, priorizando o consumo de alimentos naturais e integrais, como: vegetais, frutas, cereais integrais, leguminosas, soja e quantidades limitadas de chá verde.
- Dieta Cetogênica: este é um padrão de baixíssima ingestão de carboidratos (<50g por dia) e exclusão de alimentos refinados e ultraprocessados, alimentos de alto índice glicêmico e fontes de gorduras trans. Ela pode ser benéfica para redução de peso em curto prazo e promove a diminuição de níveis pós prandiais de glicose/insulina, pressão arterial, triglicérides, além de aumentar HDL-C. Porém, é importante ter atenção ao tipo de gordura consumido nesta dieta, pois ele vai determinar o efeito na redução do risco e mortalidade CV. Se o consumo elevado for proveniente de gorduras saturadas e colesterol, levará a aumento de LDL-C. Pode acontecer de a perda de peso rápida nesses pacientes provocar aumento na absorção intestinal de colesterol. Neste caso, deve-se considerar o uso de um inibidor da absorção, como o Ezetimibe, por exemplo. Não existem estudos prospectivos de longo prazo que comprovem a redução no risco CV com a dieta cetogênica.
- Jejum intermitente e comer em janela de tempo reduzida: a orientação mais comum para perda de peso é restringir o total calórico diário (redução de 500 a 700 kcal/dia). Isso pode ser alcançado por restrição calórica contínua (manter a dieta todos os dias) ou em dias alternados (ex: jejum intermitente, dietas que mimetizam jejum ou comer em tempo reduzido). O jejum intermitente pode ser feito a cada dois dias ou duas vezes por semana (5:2). Uma dieta que mimetiza jejum consiste em 5 dias por semana de redução de calorias, de carboidratos e alto consumo de gorduras. Comer em janela de tempo reduzida é consumir alimentos apenas num intervalo de 6 a 10 horas, no período ativo do dia. Estas abordagens reduzem o total calórico, facilitam perda de peso, melhoram função cognitiva e todos os parâmetros metabólicos relacionados à DCV (sensibilidade à insulina, PA, lípides e marcadores inflamatórios). A perda de peso com jejum intermitente preserva mais massa magra e metabolismo basal, especialmente se for acompanhada de da prática de atividade física. É importante enfatizar que a ingestão de alimentos deve acontecer durante o dia, ao invés da noite, pois isso leva a maior termogênese e níveis mais baixos de glicose/insulina. Mas, e a orientação de se comer a cada 3 horas? Estudos mostram que fazer mais refeições no dia, incluindo lanches intermediários, pode não ser tão eficaz na perda de peso, quanto realizar apenas três refeições diárias, mantendo o total calórico diário. Vale lembrar que não há diferença na perda de peso quando se faz restrição calórica contínua ou em dias alternados.
- Suplementação de vitaminas e minerais: na ausência de deficiências nutricionais, suplementar nutrientes não reduz o risco CV. A suplementação de cálcio pode, na verdade, aumentar o risco. Por outro lado, o consumo de nutrientes através de alimentos, especialmente cálcio e vitamina D, está associado a menor risco. É o caso dos laticínios que, apesar de conterem alto teor de gorduras saturadas, apresentam outros nutrientes benéficos, e talvez por isso, possuem efeito neutro ou favorável na prevenção de DCV.
- Ômega 3: A ingestão de alimentos ricos nestes ácidos graxos reduz o risco e algumas meta-análises sugerem que a suplementação com EPA e DHA pode reduzir os eventos CV. Entretanto, dois dos maiores estudos prospectivos com esta intervenção, trouxeram resultados contrastantes em pacientes com alto risco CV e hipertrigliceridemia. Enquanto o estudo REDUCE-IT demonstrou redução de grandes eventos cardíacos com o uso de EPA purificado, o estudo STRENGTH que utilizou uma preparação de ácido carboxílico de ômega 3 (cápsulas concentradas de EPA e DHA), foi interrompido precocemente, pois não houve redução do risco. Sendo assim, o potencial benefício da suplementação de ômega 3 pode ser dependente do risco CV inicial, uso de estatinas, desfechos CV estudados e da composição dos ácidos graxos ômega 3.
- Adoção de estilo de vida favorável: manter alimentação inadequada, sedentarismo e tabagismo são comportamentos que podem afetar o risco de DCV independentemente de fatores genéticos. A adoção de um estilo de vida favorável está associada à redução de quase 50% do risco de doença arterial coronariana. Existem barreiras para se manter um padrão alimentar adequado, como custo, tempo de preparo de refeições e preferências familiares. Para otimizar a adoção de hábitos saudáveis, os pacientes devem ser orientados com planos alimentares baseados em evidências e encaminhados a nutricionista especializado. Algumas orientações são eficazes e podem ser iniciadas no consultório médico, como estimular o consumo de frutas e vegetais sem sal, leite, iogurte, pães ou cereais integrais e alimentos com redução de sódio.
obs. conteúdo meramente informativo procure seu médico
abs
Carla
https://cardiopapers.com.br/
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