DEVOLVENDO TODOS OS COLOS
Fabrício Carpinejar
Os pais sabiam me segurar com uma mão enquanto seguiam com outras tarefas. Com tal domínio, que a minha cabeça se encaixava nos ombros deles. Eu me acalmava olhando o mundo pelo retrovisor e escutando as suas vozes.
Os pais me seguravam pela barriga, com a nuca deitada na régua do antebraço.
Espiava o chão, e recebia carícias nas costas para respirar melhor.
Os pais me seguravam de frente, ficava sentado no ar, com as pernas estendidas na cintura.
Os pais me seguravam junto ao seu corpo, de modo que fechava os olhos contra o peito. Relaxava ao ouvir os seus batimentos cardíacos.
Os pais me seguraram com os braços entrelaçados, embalando-me como se fosse uma jangada. Eu navegava certo do nó firme e indestrutível da vela.
Os pais me seguravam em suas costas, podia mexer por dentro dos caracóis de seus cabelos descortinando a paisagem.
Os pais me seguravam com as palmas severamente esticadas para atravessar a rua e as pontes.
Os pais foram o meu berço, o meu mosquiteiro, a minha escada, a minha poltrona, a minha cadeira de balanço, a minha rede, o meu armário. Chorei, ri, espantei-me em seus acalantos e fui descobrindo que não era sozinho.
Das grandes devoluções da vida, nada é mais bonito do que dar colo aos pais.
“Cuide dos pais antes que seja tarde” (Grupo Editorial Record, 10ª edição)
Fabrício Carpinejar é poeta, cronista, jornalista, professor e está
no The Noite pra falar do seu novo livro: “Cuide dos pais antes que
seja tarde”.
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